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VIVER E MORRER POR INTEIRO -ADOÇANDO AMIGOS E OS DIAS DE TRABALHO.

  • Foto do escritor: peixotonelson
    peixotonelson
  • 11 de mar. de 2023
  • 2 min de leitura

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Filho de cearense que chegou na pacata cidade do interior do Amazonas foi onde nasceu o protagonista desta história que vou contar, relatada por sua neta considerada a mais querida. Vocês tem notado que meu foco está nos direitos de idosos?

Nosso velho Chico aprendeu a amar o rio e se encantar com os sons cansativos dos barcos cortando a água até chegar ao porto de sua cidade, bem na frente de onde vendia caldo de cana. Detestava as estradas de rodagem que cortavam a floresta, sujavam os igarapés, afugentavam os animais e incensavam as flores do caminho com fuligem e monóxido de carbono.

A experiência do "bate-bate" do motor puxador de toras de madeira era o que mais o entediava. Certamente, alguma vez na vida acompanhava o ranger sofrido das derrubadas das árvores que os trabalhadores entregavam as árvores em toras, descidas dos igarapés, depois das grandes chuvas, até chegarem ao porto das serrarias na cidade.


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Aquela vida das derrubadas de árvores nunca fora a sua, embora mais tarde fosse trabalhar com elas. Aprendeu que as jangadas para chegar às serrarias juntavam-se calibrando as toras de madeira que não flutuavam com aquelas que permaneciam à flor da água. Conhecera amigos dessa labuta no porto da cidade, onde servia a melhor garapa da cana, matadora de sede de muitos trabalhadores suados.

Ficou conhecido como Chico Garapeiro. Depois de muitos anos, foi convidado para estreitar os laços com os trabalhadores das serrarias. Entrou firme no ramo e seguiu a vida trabalhando com o corte da madeira. Chorava porque as lâminas lançavam serragem fina de madeira no ar e atingiam seus olhos. Melhor trabalhar com a madeira molhada, dizia aos colegas de trabalho. Aprendeu a manejar as fitas elétricas de corte, mas, polivalente que era, também arrumava as tábuas e perna-mancas, ripas e caibros que cortava. Assim viveu muitos anos, entre as lâminas cortantes, com mãos calejadas, os olhos embaçados e a garganta seca. Como o chamavam de Chico Garapeiro, devia ter saudade do tempo em que sua banca era uma fonte de energia para trabalhadores sedentos.


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A neta me contou dois pequenos dramas de sua vida. Certa vez, com o zumbido da serra que manejava e com o lacrimejar dos olhos, num lance de distração, a serra atingiu seus dedos da mão esquerda. Para aquela intrepidez e valentia do Chico, parecia coisa pouca, apesar do sangue abundante com serragem e do espanto. Corrida para o hospital em Manaus, limpeza paralisante do sangue e atadura forçada. Pontos quase impossíveis de dar no dilaceramento dos dedos mutilados. Assim me relatou sua neta.

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O Chico fez seu caminho de volta para a casa. De garapeiro a serrador de madeira que abrigou famílias para se manterem unidas sob o mesmo teto. Retornou e reencontrou a família de coração inteiro para casa. Tristeza que se apagou logo. Entretanto, de cinco dedos hábeis a dois apenas, nunca deixou de acariciar filhos, netos e de nos deixar a lição.

Para salvar a mão, entregou o movimento de três dedos como registro de sua vida, tão comum entre nós, de gente simples que passa o tempo adoçando a vida dos outros. (NP)

 
 
 

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