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O NAUFRÁGIO DA GOIABADA E A GAIVOTA SEM NINHO

  • Foto do escritor: peixotonelson
    peixotonelson
  • 19 de fev. de 2022
  • 2 min de leitura

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Saímos de viagem na quinta feira de setembro. No caudaloso grande, como se chama o Amazonas, os furos de corredeira e os paranás que abreviam horas de viagem, estavam rasos. Resolvemos parar o barco para almoçar, bem na boca do Paraná da Ilha do Cabra, nos abrigando do vento forte que levantava a areia da praia.


Caminhava alguém que vinha na nossa direção. Trazia ovos de gaivota nas mãos e uma sacola pendurada nos ombros, que nos parecia pesada. Estranhamos que nos viesse presentear ovos de gaivota.


Fiquei pensando no livro que trazia uma fábula, publicada em 1970, sobre uma gaivota aprendiz de voo que fazia mil manobras para aproveitar a força do vento e plainar. Esse pensamento nos fez recusar a oferta e nos oferecer para levar de volta os ovinhos. Caminhamos com o velhinho para reencontrar o ninho, mas só vimos uma gaivota solitária com seu canto de dor, fazendo rasantes sobre nossas cabeças.


Corremos e quebramos os ovos. Tristeza e menos gaivotas dançando na praia e competindo com as borboletas amarelas!


O sol se punha. Não vimos as acrobacias das gaivotas. Ao lado do nosso barco, fizemos um fogo, mergulhamos um pedaço de jabá na água para diminuir o sal, assamos e comemos. Não havia peixe, nem lua e nem gaivota. Para nossa surpresa, o velhinho veio com sua sabedoria e disse: "vocês sabem quando o suor clama por seu dono? Dessa vez não é salgado, mas doce."



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O velhinho tirou duas latas de goiabada do saco que trazia e contou:

"Uma barco, carregado de mercadoria, ao subir o rio, naufragou. Ninguém morreu, mas ficou abandonado no fundo do rio. Os moradores da região, à medida que o rio secava, mergulhavam até os porões e encontraram um carregamento de latas de goiabada. Aqui a prova desse fato. Vamos comer e tirar o sal da boca. A vida pode ser doce nessa solidão".


Acabada a história, o velhinho sumiu na escuridão da noite, com relâmpagos a prenunciar chuva.

Recolhidos nas redes, fomos conversando sobre o que o velhinho nos ensinara.


"O suor que clama pelo seu dono". Discutimos sobre o preço das mercadorias nos altos rios da Amazônia, o custo das viagens lentas, subindo o rio, as despesas da viagem e o lucro do patrão. Não nos enganemos, pois esse sistema de deixar mercadoria, subindo o rio e recebendo os produtos (farinha, peixe salgado, castanha, borracha e frutas) na baixada, tem artimanhas de exploração e lucro fácil?


A noite passou e amanheceu. Resolvemos ler a carta de Tiago, 5,4, numa tradução que ilumina essa questão e lembra do velhinho sábio.


"Eis que o salário dos trabalhadores que ceifaram os vossos campos e que vós, desonestamente, deixastes de pagar está clamando por justiça; e tais clamores chegaram aos ouvidos do Senhor dos Exércitos".


Naquela viagem e muitas outra daquele ano, depois de comer nas casas, quando nos ofereciam, generosamente, do melhor que tinham, nos serviam goiabada como sobremesa.

Esse tema do trabalho dos ribeirinhos foi iluminado pela passagem de Tiago, pela sabedoria do velhinho e pelas acrobacias das gaivotas para sair das garras dos patrões.

(NP)

 
 
 

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