O MITO DO POÇO DO TUBÁ, MORTE E VIDA COM DIREITOS INFANTIS.
- peixotonelson
- 16 de set. de 2023
- 2 min de leitura

Crianças que “caíram no rio”, desaparecidas sem deixar sinais, porque eram “devoradas pela fera”. Ribanceira solitária, que, no final da tarde, recebia as mães que vinham chorar seus filhos perdidos, debaixo de uma castanheira encurvada que bebia água pelas folhas, cujos ramos tocavam no rio e que nunca mais deram flores nem frutos. O que aconteceu, perguntei.
Contaram-me o seguinte: um monstro, qual fera devorava crianças, uma a uma que chegava até à beira para apreciar o movimento do rio, às vezes, ver o rebojo da correnteza, o movimento dos regatões, o compra-compra das mercadorias e a entrega da produção. Algumas vezes, havia festa à noite toda, até o amanhecer, e servia-se de muita bebida forte para distrair os adultos e deixar as crianças soltas na diversão.
Um sábio e velho indígena falou: “Olhem as outras castanheiras, elas estão erguidas para o céu, enquanto aqui, à beira do rio. Quando a festa acaba, o choro não para com tanta morte e com a ausência de nossos filhos”.
Através de um sonho, o índigena revelou, decifrou as lágrimas das mães e convocou. “Mulheres! Reúnam-se, deixem o cabelo crescer, façam um trançado forte e preparem-se para o combate; amarrem o trançado no tronco da castanheira. Na outra ponta, um menino vai morrer, porque ficará espetado numa estaca, como um peixe de isca. Será o útimo sofrimento. Quando a fera passar, podem dar para ela comer, mas soltem todas as embarcações do porto".
Assim aconteceu, apesar de todos os gritos de dor e de protesto. A castanheira dobrou com a força do mostro, houve um estrondo, todas as árvores por perto perderam as folhas e o bicho nunca mais voltou. A castanheira, embora curvada, florescia a cada época de festa, as famílias cresceram e as crianças voltaram a pular na água, brincar de mergulhar e fazer da canoinha a sua bicicleta.

Está lá aquela castanheira como testemunho, livro aberto, notícia inesquecível, sinal inequívoco de que o povo unido jamais será vencido. Marca de que um povo bem informado não será enganado. Povo que se libertou e fez a vida voltar a ser livre. Nunca mais as mães permitiram que os patrões levassem crianças para serem empregadas domésticas na cidade grande. (Foto de Gisele B. Alfaia) Este mito tem muito a nos dizer. Não pertence mais ao velho indígena e nem a quem contou ou recontou. Perdeu-se o autor originário e se fundiu no leitor que luta contra o trabalho infantil e toda a forma de exploração sexual de crianças.
“Quem tem ouvidos que ouça, escute e ausculte o coração das mães que perderam seus filhos!"
(As fotos foram cedidas generosamente pela fotógrafa Gisele Braga Alfaia @giselealfaia)
(NP)











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