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O BEIJA-FLOR DESPERTADOR, CURADOR DAS INDIFERENÇAS

  • Foto do escritor: peixotonelson
    peixotonelson
  • 10 de nov. de 2023
  • 4 min de leitura

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Um pássaro estampado na parede escura de um velho hospital fez-me recordar de uma bela história do "Reino dos Sonhos" que conhecera no tempo de criança que observava os beija-flores do jardim da casa de minha avó. Eu adorava contar em quantas flores o animalzinho pairava para sorver o doce néctar silvestre, antes das formigas vorazes chegarem. Conto com saudade essa história que me despertara para a solidariedade entre os trabalhadores da saúde.

Era uma vez uma cidade grande que nunca ouvira e nem imaginava o som do bater das asas dos pássaros, inclusive de um leve beija-flor. Ao lado da porta do hospital, havia um lindo pássaro pousado como pintura de parede. Servia de saudação para quem entrasse ali, esperasse a consulta e saísse com ar preocupado, olhos brilhando a segurar a receita médica sem condições de adquirir os remédios.


O segredo do beija-flor estava no sorriso das duas enfermeiras que entravam e saíam da sala de curativos. Como descobrir o segredo que elas portavam no sorriso em contraste com os pacientes desanimados e angustiados?


Pus-me a investigar, olhando para todos os lados. Nada me sinalizava. Entretanto, eu via que, naquela manhã clara, sombras ligeiras diminuíam o clarão do chão da porta, logo sumiam velozmente. Fui até a porta e dei uma olhada. Crianças na rua esperavamoocasionl o seu canequinho de café que as duas enfermeiras davam todos os dias para elas.


Mais do que isso, a lanchenete que ficava a uns 30 metros do hospital, ocasionalmente, completava o café, dando umas raspas de pão para as crianças. Num dia comum, na entrada de um médico plantonista, este viu as crianças roendo pão velho, debaixo da pitntura do beija-flor. Só Deus sabe por que o coração daquele médico se compadeceu das crianças. Foi até a lanchonete e ali se comprometeu que servisse, todos os dias, um pão com manteiga para as crianças, até que ele mesmo tomasse as providências mais sustentáveis. Nas sextas-feiras, pagaria as despesas.


No mês seguinte, tendo "sextado" e planejando ir ao "happy hour" com as duas enfermeiras, aquelas que, às escondidas, davam café para as crianças na rua, ele viu duas delas sentadas, exatamente escoradas na parede do beija-flor pintado. Quase que, ao mesmo tempo, houve uma corrente invisível de sintonia solidária despertando os três amigos que estavam dispostos a passar um bom começo de um final semana, no barzinho, ao pôr do sol.


O trio aproximou-se das duas crianças, e uma das enfermeiras falou para elas:"Vamos levar vocês para passear!". E os cinco entraram no carro e foram passear, sem muito saber aonde iriam. Uma das crianças falou que estava ficando perto da casa delas. E a maiorzinha disse: "vamos lá?". Eram dois irmãos que moravam com a mãe.


Precisaram deixar o carro e descer uma buraqueira para encontrar o casebre das crianças. Eis o que encontraram. Algo misterioso havia no beija-flor, que funcionou como despertador do sono de muitos daqueles que olhavam a vida sem enxergar a dor e a tristeza dos que encontram? Duas respostas podemos admitir. Em vez de um beijo terno de um colibri, podia entrar em cena o canto de um agouro, a revolta ou a acomodação perpétua.


Para o quinteto que entrou no barraco dos dois irmãos, houve uma outra resposta. Não havia jardim, à beira de um poço, sem pôr de sol, mas uma grande pedra que se chamava miséria para ser superada. "Mãos à obra", disseram juntos a encontrar a mãe deitada no chão em completa paralisia nas pernas, que vivia se arrastando. Nem o bico dos pássaros, nem a brisa na mangueira derrubaram um fruto para aquela mulher comer.


Cada um, sem saber o que fazer, trouxe a poesia para cantar as flores e com elas se identificaram, antes de chamarem o Samu para carregar a mãe das crianças para o hospital e começar o tratamento.


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Quando me contavam essa história, uma visão, entre a fumaceira de outubro de 2023 e a esperança da Luz do Natal, pôs-me a delirar.

Os cinco amigos apareciam para mim, vestidos de flores, cada um com sua específica floração na cabeça. A orquídea dava mão ao girassol, e a açucena estendia sua folha comprida até a zina. O jasmim, em pé, carregava a mulher nos braços e entrava na ambulância. De repente, o pendão da zina e do girassol dobraram-se e quebraram. A "visão" aumentou:


Olhei para o lado e vi a açucena e a orquídea correndo para acudir o jasmim que carregava a mãe das crianças. Neste momento, entra um raio de luz, naquele antro pobre e sujo, tal como está ficando o mundo. Dentro do túnel de luz, vem voando o beija-flor, igualzinho ao da parede do hospital. Pousa nas pétalas da zina, depois no centro do girassol que me despertava para eu entrar em solidariedade.


Volta-me a consciência quando ouço a cirene da ambulância em disparada e chegam as notícias de bombardeios sobre as ambulâncias na faixa de Gaza.


A foto acima é de Gisele B. Alfaia, em regsitro de sua navegação pelos rios da Amazônia - @giselealfaia.


 
 
 

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