A SAUDADE FERE O CORAÇÃO E MOLHA OS OLHOS - A SOLIDÃO.
- peixotonelson
- 15 de out. de 2022
- 3 min de leitura
Atualizado: 15 de out. de 2022

Num domingo, em fim de manhã, caminhamos ao sol e nos sentamos, à sombra, para conversar no mesmo banco que servia de cama. Ele estava pesado no álcool, mas inteiro para falar coisas sérias da vida e lembrar letras de músicas do passado. Em uma dessas músicas, que a voz embargava quando pronunciava a palavra pai, ao entoar a canção do Fábio Júnior.
Vi o rosto molhando e o disfarce com o movimento das mãos, tentando abafar o sentimento. Enfim, parou a música e como quem, criando coragem de falar, vai contando. "Levei meu pai para casa, dei banho, vesti a minha melhor roupa e coloquei-o na minha cama. Fui dormir na cama da minha mãe".
Teve que responder a ela quando perguntou: "Por que você faz isso com seu pai?" Não sei afirmar se meu amigo respondeu para ela ou se estava respondendo para mim que estava ouvindo-o: "Fiz porque o amava muito". Meu amigo, desconversou.. Eu disse que queria escrever a história do seu pai.
Contou-me com pesar que recusou a terra que o pai queria passar para o seu nome, lá em Novo Aripuanã, AM. Entre outros irmãos, o pai veio buscá-lo para essa intenção, mas não tinha como aceitar. Não poderia deixar a família, em Manaus, para seguir com o pai e ir para longe, no Rio Madeira. Filhos pequenos e a mulher eram suas prioridades.
Na manhã seguinte, conversei sobre o Evangelho da Ovelha desgarrada que Jesus contou, revelando como Deus se comporta e sussurra seu amor na história da gente. Assim, meu amigo prosseguiu e foi contando. um pouco mais, a história de seu pai.

Contou-me. que o pai era um navegador, conhecido como regatão, do Rio Madeira, Am. Alegre e de amizade com os ribeirinhos, porque o coração dele não suportava ver a fome e o abandono. Sempre deixava alguma coisa, e com isso, facilitava o negócio: "Pague na próxima viagem, arranje algum produto para pagar". Ia, de porto em porto, vendendo ou trocando mercadorias.
Os irmãos, embora mais velhos, sabiam só pescar e roçar. "Eu que ajudava o velho anotando as compras e fazendo o livro de dívidas" Falou com clareza para o pai que precisava voltar a estudar. Neste tempo, a mãe adoeceu, o pai vendeu tudo e resolveram sair de Manicoré, no Amazonas. Mudaram-se, para Manaus, onde já estava uma irmã mais velha. Começaram a viver com 12 pessoas num quarto, cujo dono abriu uma parede e ampliou o quarto para caber a todos. Assim, começaram a vida, encontrando sempre gente para mostrar que Deus não os esquecia na cidade grande e estranha.
De Mano Zé era chamado o velho pai. Separado da mãe foi tentar a vida em Novo Aripuanã, onde depois de aposentado, como "soldado da borracha", morreu de cirrose hepática.
Meu amigo, nessa foto que me autorizou publicar, vai me contar porquê e como o seu pai passou a beber com frequência diária. Hoje, não perde o humor e nem se queixa. Mas, deve ter dentro de si, as dores que a vida lhe impôs, devido às escolhas que fez. Talvez para não sofrer tanto, sempre carrega sua garrafinha de cachaça e dorme no banco e não quer voltar para a família. Não sei até quando o seu corpo vai suportar viver longe da família. Ou quando vai deixar de beber para encontrar outras alegrias que Deus preparou para ele, antes de morrer.
Uma coisa é certa. Deus está conduzindo-o nos ombros para que não se perca do rebanho. "Disse Jesus: O Reino é semelhante a um pastor que tinha cem ovelhas. Uma delas se extraviou, e era a maior de todas. Ele deixou as noventa e nove e foi em busca daquela única até achá-la. E, depois de achá-la, lhe disse: eu te amo mais do que as noventa e nove. (Lucas.15 4-7).
A história de seu pai é a mesma que, hoje, o meu amigo leva, seja na bebida diária e na vida longe da família. Falar do pai e falar de si. Triste caminho à espera de ombros fraternos!











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