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MISTÉRIOS DOS RIOS E FLORESTAS COM RISCO DA NATUREZA ACABAR.

Nos dias que caminho à luz do sol, deparo-me com pessoas idosas que vão chegando para saborear o almoço de um restaurante. Meu desejo escondido era ficar e ir juntar-me a elas. Entretanto, acovardava-me e passava adiante. Sempre olhava para ver se conhecia algum velho companheiro das andanças das ruas. Naquele dia, criei coragem porque vinha frustrado por não ter encontrado, no banco da pracinha, aqueles que já conhecia, inclusive onde tínhamos partilhado pipoca e café, contado e escutado muitas histórias registradas no meu último livro: “Alegrias Sem Fim e Penas Passadas”.


Quase todos estavam sentados e enfileirados, de costas para a parede, com espaços vagos no meio entre um e outro. Fui passando e sentei-me, silenciosamente, ao lado de um que imaginei adiantado nos anos. De fato, depois de sussurrar umas perguntas, revelou-me que tinha 88 anos e viera do alto Rio Solimões, das bandas de Atalaia do Norte, AM, nas fronteiras do Peru. Ele era filho de um português e de uma cearense. Curioso que era, não obtive respostas às minhas perguntas acerca do encontro e casamento dos pais. A família tinha um seringal perdido no meio da floresta, cortado por igarapés. Tristemente, revelou seu desgosto e arrependimento por ter sido aposentado como soldado da borracha.


Este filho do português com uma cearense veio para Manaus antes dos quarenta anos. Disse-me que, no dia que seu pai casou de novo, ficou revoltado e saiu para caçar. Recordou que, depois de caminhar sem rumo, encostou-se numa tora de madeira derrubada e começou a pensar na vida e no seu futuro. “Fiquei encantado por uma cobra jiboia. Só fiquei sabendo que estava assim perdido e atraído por ela quando percebi que, querendo pegar a estrada de seringa, fiquei sem saber como e cada vez eu voltava para o mesmo lugar.” Apavorado, lembrou da “sabedoria” do pai, que já tinha lhe dito que quando a jiboia vê primeiro a gente, ela desaparece da nossa vista, e tem só uma forma de escapar, que é tirar a camisa e vesti-la do avesso.  Assim fez e reencontrou o caminho de volta.


Outra vez, estava remando numa volta do rio, passando por um rebojo que parecia um furacão aquático a arrastar a sua canoa que ficava em rodopio. Pensou que só podia ser a cobra grande se mexendo naquela profundidade de 17 braçadas. Nesse momento, lembrou-se de uma outra lição que o pai português aprendeu dos indígenas do local. Nesse caso, bastaria quebrar uma garrafa de cachaça que a cobra se afastaria, e assim fez. Foi salvo da boca da fera.


Perguntei como pode ser aquilo, achando que a cobra fosse ficar bêbada. Ele respondeu com clareza: “ela engole como tira-gosto, antes do "jantar" que se aproximava, mas se corta com os vidros e, sangrando por dentro, vai para mais adiante e não me jantou.” Certa vez, teve coragem de voltar, no fim da tarde, acompanhado, mas só viram dois" faróis" à distância, que eram exatamente os olhos do monstro.  

Relatou-me também o caso do mistério invisível do “bate-bate” que acontece quando vai à beira do igarapé ou está pescando, acompanhado do cachorro de caça. Um estrondo ensurdecedor, bem ao lado, igual ao remo dando palmada na água, ficando com os tímpanos doendo e as mãos tremendo de medo. Olhando para mim, disse: "Só o cachorro conseguia ver a assombração e sair em disparada".


Esses mistérios fizeram-me lembrar de outras aventuras “mágicas” e indecifráveis da Amazônia. Vai uma aventura de sucesso de um filho de cearense que matou uma anta, cortando o tendão de aquiles que faz referência à famosa história da mitologia grega, em que um guerreiro de corpo invencível tinha somente o calcanhar vulnerável. No caso desta aventura, fora uma anta paquidérmica, que se emaranhaou num tipo de árvore-prisão formado com suas raízes aéreas, facilitando assim que o caçador feroz cortasse com um facão o tendão da anta e vencesse a batalha. Fiquei triste com esse final da morte da anta. Talvez a anta tenha se precipitado e correu com medo para salvar seus filhotes, pois o lugar da prisão deveria ser do caçador.


Refletia que a natureza tem seus “anjos protetores”, que, afugentados pela cobiça, deixaram que a devastação tomasse conta da floresta, abrisse as veias de sangue transformadas em estradas, matando a vida exuberante. Os rios se envenenaram com mercúrio e estão matando os peixes. Trazem o brilho do ouro dos garimpos em forma de morte.  

 

Obs. Créditos das fotos a Giselle B. Alfaia @giselealfaia

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